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A regra de ouro da pintura de Wessel Dijkstra

Wessel Dijkstra nasceu em Schoonoord, na Holanda, em 1944. Estudou artes na Academia Minerva, em Groninhgen, entre 1963 e 1968. Nos estudos iniciais, começou por se interessar pelo impressionismo e depois pelo expressionismo. Klimt e um certo tipo de “art nouveu”, jovem e de oposição ao academismo, a que a psicanálise de Freud dera fôlego foi uma das suas primeiras referências. Em Klimt interessa-lhe sobretudo o recurso ao motivo geométrico repetido, utilizado como mosaico ao estilo bizantino, onde abstração e realismo se confrontaram.

Mas as suas inquietações quiseram que fosse além.  

Após terminar os estudos académicos, inicia um percurso pessoal de construção de uma chave de leitura da realidade que definisse a sua linguagem de expressão. À sua volta, observando o mundo, tudo lhe parecia partir de um número e ser estruturado por sequências numéricas. Desde as toalhas nos entendais de roupa às pedras da calçada, Wessel encontrava motivos geométricos que lhe prendiam a atenção. Para melhor compreender a inquietação dessa forma de apreensão da realidade, dedica-se ao estudo da matemática. 

Na sequência de Fibonacci (matemático que introduziu os algarismos árabes na Europa), encontra o ponto de partida para o que lhe interessa. Mais do que definir uma mera sucessão infinita e organizada de números  cuja ordem é dada pela soma dos dois anteriores, a sequência de Fibonacci encontrou na natureza a proporção ideal aplicada à vida, às construções e à arte. Nessa sequência, a partir do três, o coeficiente de divisão entre um número e o seu antecessor é sempre 1,6. Este chamado número de ouro é precisamente a proporção do rectângulo de ouro dos gregos, das pedras da pirâmides dos egpícios e, por exemplo, da espiral do crescimento das folhas das plantas.   

Wessel estabelece a sua regra de ouro: no princípio era o número. E é com o número que começa a construir paulatinamente, uma linguagem. 
Nesse processo de construção de um código de comunicação, ainda na década de 70, foi fundamental a participação num encontro entre artistas e aquitectos. A partir daí, a geometria ocupou definitivamente o seu universo artístico. O quadrado, que já em Klimt lhe interesara, entra na sua obra, definindo e limitando o espaço da pincelada e da cor. A sua pintura ou escultura passa a ser composta por estruturas quadriculares e esquemas predominantemente geométricos. Assume, nessa altura, ainda que não completamente, a influência da arte bizantina. 

Nos anos 80, toma uma decisão que muda radicalmente a sua vida. Deixa a Holanda e parte para repensar, noutros lugares, a sua relação com o espaço, o tempo e o acto criador. Com o número e o quadrado como pressupostos,  inicia o percurso na Escócia, onde não se detém. É então que decide aprofundar o conhecimento na arte islâmica, estudando o mosaico. Ruma a Marocos, passando por Portugal, onde fica mais do que tinha previsto e contacta pela primeira vez com a azulejaria portuguesa. Quando finalmente chega a Marrocos, em 1983, mergulha na arte islâmica e assume-a como fonte primordial. Tal como os islâmicos, passa a usar como base da sua criação o quadrado latino, uma matriz quadriculada em que cada número ocorre apenas uma vez em cada linha ou coluna. Mas ao invés daqueles, que o usam como esquema para conseguir desenhar figuras geométricas proporcionais, unindo os pontos a que correspondem os mesmos números espalhados no quadrado, Wessel cria uma escrita própria ao fazer corresponder a cada número de 0 a 9, um mosaico gráfico diferente. 

Os estudos preparatórios das suas obras são pois extensas tabelas de números sequenciais que nunca se repetem em cada linha e coluna. Esses números são substituídos na obra pelo mosaico gráfico correspondente – uma divisão geométrica do quadrado pequeno, muito influenciada por Sol Lewitt, Straight Lines in Four Directions and All their Possible Combinations (Set of 15+1), TATE – um signo que posteriormente, num demorado processo de coloração e raspagem de tinta, pinta. O resultado é uma obra em que além de uma leitura pictórica inicial há uma metafísica que convoca o espectador para a descodificação que permite, como um jogo lúdico intelectual, encontrar os níveis de leitura e soluções que o quadrado latino permite. 

Nada é ao acaso, portanto, na pintura de Wessel. Dir-se-á que é uma pintura exacta. Não no sentido que na arte portuguesa contemporânea Joaquim Rodrigo lhe dava, da procura incesante da formula química do pigmento “certo”. Nem tão pouco da lógica dos trabalhos de Eduardo Nery, intitulados Estudos de Cor, em que os mosaicos evoluem sequencialmente dos tons quentes para os frios e vice-versa, abarcando o espectro da paleta como se de um arco-íris se tratasse. Em Wessel, o mosaico é uma parte de um jogo de xadrez onde a regra é definida matematicamene, pelo quadrado latino, sem margem de erro, e não por questões pictóricas ou de rendilhado geométrico que procura a perspectiva e tridimensionalidade, como se diria acontecer em Vieira da Silva. 

Na senda de Sol Lewitt, uma das suas grandes influências, Wessel construiu um universo artístico conceptual onde também transforma o olhar do espectador numa relação performativa de leitura com a obra de arte. Uma leitura que, no caso de Wessel, dá o código e permite resolver a charada perfeita, como se de um desafio de sudoku se tratasse.   

É isso que Wessel procura nas suas obras. Uma perfeita e divina proporção, a mais humana e real aspiração, razão de ser e de existência de toda a Arte.   

Luís Neves
Monte Real, 10 de abril de 2017

Wessel Dijkstra’s golden rule of painting


Wessel Dijkstra was born in Schoonoord, the Netherlands, in 1944. He studied arts at the Minerva Academy in Groninhgen between 1963 and 1968. Initially he was interested in impressionism and later in expressionism. Klimt and a certain type of “art nouveau”, young and in opposition to academia, to which Freud had given breath, was one of his first references. In Klimt he is mostly interested in the recourse to the repetition of geometrical motif used as a mosaic in the Byzantine style, where abstraction and realism confront.


But his disquiet took him further.

After completing his academic studies, he began a personal journey of constructing a key to reading reality that would define his language of expression. Around him, looking at the world, everything seemed to start with a number and to be structured in numerical sequences. From towels drying in lines to the stones in the sidewalks, Wessel found geometrical motifs that caught his eye. To better understand the restlessness of this way of seeing reality he dedicated himself to the study of mathematics. 

In the Fibonacci sequence (the mathematician who introduced Arabic algorithms in Europe) he found the starting point for what interests him. More than defining a mere indefinite and organized succession of numbers whose order is determined by the sum of the two preceding numbers, the Fibonacci sequence found in nature the ideal proportion applied to life, to constructions, and to art. In this sequence, from three onwards the coefficient of division between a number and its predecessor is always 1.6. This so-called golden number is precisely the proportion of the Greeks’ golden rectangle, the Egyptians’ pyramid stones and, for example, the growth spirals on plants’ leaves.


Wessel establishes his own golden rule: in the beginning was the number; and it’s with the number that he gradually begins to construct a language.
In the 70s, his participation in a meeting between artists and architects was paramount for this communication code construction process. From then onwards geometry occupied his artistic universe. The square, which had raised his interest in Klimt already, finds a way into his work, defining and limiting the space of brush stroke and colour. His painting or sculpting is henceforth composed of predominantly geometric structures and square structures. At that time it assumes, although not completely, the influence of Byzantine art.

In the eighties he makes a decision that radically changes his life. He leaves the Netherlands and departs to other places to rethink his relationship with space, time and the creative act. With the number and the square as starting points, he begins his travels in Scotland where he does not stay for long. He then decides to deepen his knowledge of Islamic art, studying the mosaic. He heads to Morocco, traveling through Portugal, where he stays longer than expected and where he comes into contact with Portuguese tiles for the first time. When he finally arrives in Morocco in 1983, he immerses himself in Islamic art and embraces it as his primary source. Like the Islamists, he starts using the Latin square - a chequered matrix in which each number occurs only once in each row or column - as the basis for his creation. But unlike them, who use it as a schematic for drawing proportional geometric figures, joining the points corresponding to the same numbers scattered in the square, Wessel creates his own writing by matching each number from 0 to 9 to a different graphic mosaic.

The preparatory studies of his works are therefore extensive tables of sequential numbers that are never repeated in each row or column. These numbers are replaced in the work by the corresponding graphic mosaic - a geometric division of the small square, much influenced by Sol Lewitt, Straight Lines in Four Directions and All their Possible Combinations (Set of 15 + 1), TATE - a sign that later, in a time consuming process of coloring and scraping of paint, he paints. The result is a work in which, in addition to the initial pictorial reading, there is a metaphysics that summons the viewer to the decoding that, in a playful intellectual game, enables the viewer to find the levels of reading and solutions allowed by the Latin square.

Thus, nothing is random in Wessel's painting. It can be said that it is an accurate painting. Not in the sense given by Joaquim Rodrigo in Portuguese contemporary art, of the incessant search for the chemical formula of the "right" pigment. Nor in the logic of Eduardo Nery's works, entitled Color Studies, in which mosaics evolve sequentially from hot to cold tones and vice versa, encompassing the spectrum of the palette as if it were a rainbow. In Wessel, the mosaic is part of a chess game where the rule is defined mathematically, by the Latin square, with no margin of error, and not for pictorial or geometric tracing that seeks perspective and tridimensionality, as one would say happens in Vieira da Silva.


In the footsteps of Sol Lewitt, one of his greatest influences, Wessel constructed a conceptual artistic universe where he also transforms the spectator's gaze into a performative reading relation with the work of art; a reading that, in Wessel’s case, gives the code and allows one to solve the perfect charade, as if it were a sudoku challenge.


This is what Wessel looks for in his works: a perfect and divine proportion, the most human and real aspiration, reason for being and existence of all Art.


Luís Neves
Monte Real, April 10 2017 


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